Translate

sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

sexta-feira, 8 de novembro de 2013

Uma figura privada no meio de duas figuras públicas

Por Lo-Chi




                                                      António Barros, Lo-Chi, Eduardo Constantino

As duas figuraças, que se publicaram através da caneta emprestada a voz como profissão, um exclusivamente na Rádio Moçambique, o outro um pouco mais prostituído, profissionalmente falando, claro esteja, acabou passando da voz à imagem, e agora numa espécie de pausa que se impôs. Não é para qualquer um. O primeiro, terceiro na imagem, conheci-o em Nampula, onde fomos trocando uns alós informais, e o tempo lhe foi dando um carácter mais informal ainda nos desembrulhos do dia a dia, até que desformalizamos por completo, fruto de vários cruzamentos, apesar do seu público ser de âmbito nacional, respeito é bom e ele gosta, ja que Secretário Nacional do Sindicatos dos Jornalistas. E hoje já fazemos essa parceria público privada. O outro, com um sorriso meio comprometido por circunstâncias que a imagem revela, a nossa relação vem de outros carnavais, onde brincávamos, joelhos negros e calejados, nos murrôtôs* do Macuse e não só. Se de amizade imperturbada se pode falar, não o façam, apontem para nós, já que um facto não é tergiversável: quarenta e dois anos de percurso em comum, feito de solidariedades, partilhas e comunhão de aventuras, dores, prazeres e momentos difíceis da vida. Acho tanto quanto baste! E eu, o privado, levaram o meu estatuto à letra e quase que me domiciliavam na privada- no sentido brasileiro do termo- e em consequência, quando as senhoras se sentiam no aperto, tinham que me pedir autorização, confundidas, pela minha localização, que lhes induzia à suposição de eu ser o regulador do w.c.., vê se pode!?

* mangais em língua chuabo



quarta-feira, 9 de outubro de 2013

Resposta à uma pergunta várias vezes formulada


por Lo-Chi


Primeiro comecei com apenas o meu nome artístico, estampado numa coluna, cujo nome também estaria na gaveta do pouco comum, e havia razão mais que suficiente da pergunta. Em face disso, entendi para não ser um anónimo, no sentido de sem face, plasmei a minha fotografia, mesmo assim subsiste a pergunta. Quem sou eu? Não poucas vezes me perguntaram, e eu sempre me escusando. Porém, hoje, quiçá vendo a pergunta numa outra perspectiva, propus-me uma resposta. E aí está.

Não me conheço ainda e penso que morrerei sem me conhecer. As vezes, julgo que sou uma coisa, para logo a seguir compreender que nada disso sou e que faço parte de qualquer coisa bem diferente. Umas vezes, aceito-me tal e qual e...outras; não! Revolto-me, quero-me outro. E se olho para atrás, não sei de facto o que fui. Como posso saber, se me vario tão frequentemente e tão diferentemente.

Sei que fui de tudo: ladrão (e nunca roubei nada do alheio, senão de mim próprio), vagabundo (nunca passeei pelas ruas, nem estive andando, andando, sem destino...mas imaginei-me), poeta (nunca fiz poemas, senão que escrevi versos que se pretendiam), libertador (de país nenhum, mas de coisas múltiplas), construtor (e não peguei tijolo nenhum que fizesse parede), preguiçoso (ah...isso fui de facto, bastas vezes), ignorante...sei lá, quantas coisa mais?! Acima de tudo nada. Debaixo de tudo, alguém que se procura e acha justo encontrar-se perdido, nesse eu deslimitado. Esse eu que faz a pessoa.

O que é uma pessoa? Se não; as acções no sentido de satisfazer os seus gostos; a reacção perante os condicionalismos impostos; a insurgência ante os ditados; o movimento com tendência a contornar os óbices da vida; a maneira de reagir perante os factos do dia a dia, que nos vão fazendo o que somos e o que temos vindo a ser. Eu talvez seja um surpreendido! Um surpreendido perante esta vida enorme com toda sua enormidade. De vez em quando um disfarçado, face a estes factos surpreendentes. Sempre quem sabe(?), um des-integrado de toda esta complexidade atónita dela mesma.

Constitui sempre, um conjunto de emoções circunstanciais. Sou uma espécie de progressão (aritmética ou geométrica pouco importa) emocional, sem constante. Quando me sinto função, prefiro estar em função de mim mesmo.

No fundo, bem no fundo, sou o princípio e o fim, o meio e o objectivo. Sou o vento, sou a brisa, conforme as conveniências, minhas e alheias. Muitas vezes até, a pedra da calçada, a alma inanimada; sou a razão e a lógica, sou o nada fundido em desejo. Outras a sombra de um homem que não existe. Sou enfim, a intrépida convulsão da minha mente.



















segunda-feira, 30 de setembro de 2013

O aeromodelismo

Por Lo- Chi


A primeira vez que ouvi falar dessa actividade desportiva, foi pelo meu irmão, que a praticou através das actividades da Mocidade Portuguesa ou do escutismo, cujo monitor foi o já falecido David Ribeiro. Depois disso, nunca mais. De repente, naqueles meu destinos laborais, errando Moçambique fora, estou inesperadamente em Inhambane e... zás, dou com o aeromodelismo em força.


Nesse zás de imprevisibilidade, levou-me irremediavelmente aos primórdios dos anos do meu filho, onde o seu pai, que comprava todos os tipos de brinquedos para ele levar avante os seus sonhos, para satisfazer bem como incentivar as curiosidades pueris, quantas vezes não se viu ele próprio envolvido nas quimeras e imaginações, de tal sorte que as vezes, à título de acompanhar o petiz, excedia o razoável tempo de utilização dos brinquedos, com tamanho envolvimento, e lá estava ele de joelhos, num vum vum vum, e rum rum rum, rasgando as imaginadas ruas e ruelas, trilhos e carreiros, ares e espaços aéreos, com tal intensidade e extensidade que acabou provocando o irónico comentário da mãe dos seus: o pai mais criança que o filho, afinal compraste o brinquedo para o teu filho ou para ti?!.


E foi nesse Inhambane aeromodelista, num evento internacional, que me revi, vendo adultos, entre a velhice e a infância, não de joelhos, porque isso faz calos, mas de cócoras, reparando e repondo as peças dos seus modelitos, colocando-os nas pistas, entusiasmadíssimos, entre a criancice e a adultice, repovoando a infância a preços de ouro: modalidade caríssima essa. Mas quantos não pagamos, e não pagaríamos, para voltarmos a ser crianças??!!


Os aviões crianças nas pistas transformados em brinquedos, à sério, dos matulões meninos pilotando, em acrobacias de faz de conta, todavia requisitando perícia, sob o olhar serenos dos aviões adultos, que iam presenciando as manobras, que os pretensos pilotos gostariam de efectuar neles. Algumas tão arriscadas, que acabaram em verdadeiros acidentes aéreos.


No fundo bem no fundo, a satisfação de um sonho não realizado ou se quisermos interrompido; quiçá.


sábado, 31 de agosto de 2013

Um caso feito por acaso


por Lo-Chi

Se há acasos agradáveis, o que é raro, em nós, dois acontecimentos ao acaso, marcaram a nossa relação.

O primeiro foi o facto de ter-te visto, e numa visão fugaz, me teres enchido as medidas e, na emoção em ebulição, não ter sido capaz de conter um comentário inadvertido: vi aquela miúda está uma bomba! Quase literalmente, foi esta a minha afirmação que se quis ingénua, sem intenção, e apenas no jeito de uma interjeição.

O segundo não menos raro – pelos riscos que isso comporta – alguém que ouviu a exclamação, talvez pelo vigor da mensagem, haver levado, sem pedido, nem consentimento, a imagem do retrato. E talvez um terceiro acaso, o vigor da mensagem haver tocado a pessoa retratada, e nesse caso, a destinatária por acidente.

Dentro da ignorância do facto de haverem levado a mensagem, me vi; diversas vezes, no terreno escorregadio e perigoso, quando incauto e talvez sem forças para poder vencer a tentação; contemplando-te com um olhar carregado dum embevecimento comovido. Não poucas vezes o olhar passou as fronteiras dum ingénuo olhar e descambou na ânsia evidente de um anelo desesperado.

Era assim, desse jeito, que algumas vezes os nossos olhares se cruzavam – o meu cheio de expressão contida, mas quase incontrolável, e o teu que eu via como que decifrando a mensagem e dando simultaneamente uma dose de alento e esperança – e eu morria na ânsia. Na ânsia de te abraçar, na ânsia de dizer coisas bonitas. Não só, mas também morria na miscelânea de outras ânsias inconfessáveis. Perdido fiquei, louco, me achei quando atónito pude divisar, na contraluz, o entremeio das tuas coxas, dado a ver por um vestido duma transparência dadivosa, de tal jeito que o meu olhar clandestino e furtivo pode ver a cor das cuecas que cobria a tua nudez: cor-de-rosa! Disse para mim; que escultura de mulher. E nesse instante como um astro do sistema solar, entrei em órbita e perdi-me nas galáxias do universo cor-de-rosa.

Quando subitamente e tão fora do clássico nos envolvemos, senti que nunca  uma expectativa, em mim, tão grande, ficou tão aquém do real. Tu real muitas vezes melhor do que te imaginei, ou imaginei que vi nos olhares furtivos. O teu corpo de gazela, os teus beijos, a tua ânsia, a tua fúria, o teu suspiro, o teu doce e até envergonhado jeito de acariciar. A tua forma aberta de te entregares. A tua forma desinibida de falares do passado. O teu jeito subtil de ser e fazer, pôs-me agradavelmente rendido aos teus encantos.


                                                                                                                            in "Cartas Intimas"

sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Quelimane no coração -Comoventes reencontros de chuabos*


por Lo-Chi

Esta semana foi para mim particularmente comovente, posto que foi rica em gratos encontros com pessoas de quem nutro simpatia. Se com uns convivemos recordando o antanho, com outros, tendo mais tempo disponível, foi possível proporcionar encontros maravilhosos com outros companheiros que já não se viam, fazia um bom par de anos. Interessante duplamente foi levá-los aos nossos locais referências da infância e juventude, rever os sabores e odores tão distantes quanto próximos; voltar às origens.  
 
Amilcar de Melo e Eduarto White
Fomos à Nicoadala tramitar documentos bem como visitar um amigo com um projecto promissor na sua fase de crescimento e expansão. E como bons amigos que somos, para além da conversa, com temas de actualidade, enriquecemo-la com os assuntos do antigamente, desde o basquete à escola técnica, das nossas bifurcações de destino e o que coube a cada um, sempre pintalgados com a nostalgia dos momentos comuns, vistos já com olhos de saudade que tira a objectividade dos fenómenos, alterados pela mudança radical na passagem de factos para contos, e como o  ditado determina, pontos a mais e a menos aconteceram: como diria a minha avó, compreensíveis exageros de circunstância.
 
Banqueiro, Gito Jona, Beto Palha
Fomos à Namacata  comer aquela galinha verdadeiramente a cafreal, sentir a brisa filtrada pelas mangueiras, ver os êrrúndulos – rolas – rulhando nos fios de energia, e nos seus vôos acrobáticos seduzindo as fêmeas, ou os nandindis  manietados e impotentes a verem as suas mutipas descaradamente roubadas pelo prepotente jôghorrô.
  Os êrrúndulos em tarde romântica

Visitamos aquelas baixas de arrozais outrora dos nossos avoengos. Hoje, ou abandonadas e usurpadas, ou na fase de recuperação para outros fôlegos e projectos, onde cruzamos com céleres e indomáveis perdizes. Foram sete horas de um intenso domingo, onde a conversa jorrava as catadupas, quase sempre  atropelavamo-nos, numa ânsia pueril. Só de la saídos, quando literalmente expulsos por um sujeito inoportuno: o mosquito do início da noite.

Alvaro Ó da Silva(Varito) e Amilcar de Melo (Chilo)
Fomos ao Kansa rever; ajudados pelo local; as nossas futeboladas, os nossos primeiros tudo, as histórias dos nossos velhotes, as intrigas, as nossas traquinices. Vimos o local onde comprávamos as argolas do velho Lázaro, os canudos da dona Mery; imaginamos a mangueira onde o velho Paulo nos cortava o cabelo, brindando-nos ora fofocas ora histórias rocambolescas; recordamos o insólito Katulinho Umaboleia, sapateiro, que com sua própria adaga, numa posição incorrecta de corte de borracha de pneu, acabou fazendo um lanho em próprio abdómen; visualizamos as lojas do Machiel e do Manuel, com o seu desenho relativamente alterado; falamos das nossas farras. Mas o momento auge foi o encontro com a Belinha Marques, refeita das agruras da vida, que nos presenteou uma tarde cheia de acepipes; o pende assado, com chatinye de mumbakwo, camarão com nhatandho, água e sal de sarhabuanha e sôlôlo, caranguejo cozido, e finalmente o famoso tôdhwé, acompanhado com um maravilhoso achar de limão, tendo como base um bom “três tempos”- murrada de mandioca**. E como não somos chauvinistas, chamamos a mesa para nos acompanhar um bom vinho tinto, cuja marca: A Cepa Alentejana. Saímos de lá com o volume e o tom das vozes manifestamente alterados. E lampeiros, regressamos às nossas casas, hoje na cidade, numa conversa no estilo do antigamente, mais aos berros do que falando, contando anedotas, com especial destaque para aquela do milhafre, da autoria da Mercy Lázaro, contada numa mistura de mais de três idiomas, inglês, mal falado claro, português, chuabo e sena, bem no jeito daqueles meninos de bairro da preferia que fomos.
 
Beto Palha, Tótó Barros, Chilo, Belinha Marques-Bairro Kansa

E quando a casa chegado, fui impelido ao meu caderno arquivado na prateleira das desilusões dos sonhos não conseguidos, onde no meu desiderato de poeta que se queria, na sua ingenuidade, fez aquele pretenso poema incipiente e li.- e tem piada que me comoveu: Quero voltar a ser criança/esperar com ansiedade a época de manga/improvisar o que mastigar/quando com fome estiver.//Quero voltar a ser aquele menino,/calções chapados, joelhos negros e calejados/inventar brincadeiras nas horas de tédio/e fugir as mandanças da mamã.//Quero ser aquele despreocupado ocupado//comer e querer sair para as brincadeiras/sem pensar em fazer a sesta.//Quero ser aquele que fugia/apesar de sujo, daquele banho obrigatório/e dormia num só sono/quando o sol assim fazia.
 Amilcar Gil de Melo-bairro Kansa
* chuabos- naturais da cidade de Quelimane, Provincia da Zambezia- Mozambique
**alguns  pratos tradicionais da cidade de Quelimane.

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Pensamentos e emoções



Minha alma são retalhos colados, da existência, feito passado. No futuro, nada existe de confiança nem esperança, se não a teoria das probabilidades.

                                                                                                                      Lo-Chi


sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Pedido escuso, mas sempre satisfeito


por Lo-Chi

Escreve-me uma carta! Pedido talvez escuso, se se recordar que a cada instante te faço cartas.

Umas, escritas ao telelefone, as quais pela imposição da circunstância, breves, todavia, cheias de emoção e condensadas de significado. Nelas; a sublimidade é sentida na resposta que a tua voz do outro lado do fio traz; a doçura, na tua voz rumorejante que entra no meu corpo adentro, de mansinho, trazendo ondas de gozo que fazem do momento a cumplicidade da vida; a transcendência das meias palavras; imperativamente trazidas, para ludibriar as presenças comprometedoras; fazem o elo invisível, porém, forte e indestrutível.

Outras têm a noite como portadora, e nestas, as palavras soltas ao vento, no resguardo do sobrescrito, à noite minha confidente, digo desguarnecidamente que te amo. Descrevo os meus anelos, falo dos meus atrevimentos, da saudade que punge, do gesto louco incontido de, na alucinação de ao meu lado estares, passar as mãos no tufo da tua selva de vénus, do gesto louco incontido de amaciar com a língua cada centímetro quadrado da tua pele, sussurrar-te nos ouvidos coisas mil, e sem pensar nas consequências adversas, chupar teu pescoço e nele fazer o arrebol da alvorada.

Outras ainda, quando ouvindo música, num jeito sonâmbulo, me levanto e balanço o corpo na cadência do teu sorriso, ilusoriamente estou contigo, e fico feliz escrevendo beijos na tua boca, com o teu corpo divino aprisionado num amplexo de carícias.

Escrevo cartas meu amor, quando juntos, depois de havermos percorridos a noite em sintonia – numa viagem de ternuras, loucuras e fusões mil – pela alvorada, o sol se vai anunciando, e eu  desperto, e sub-repticiamente acordo o lençol, para que te dispa, e eu veja o teu corpo nu, de bruços, e embevecido me perca nas linhas do teu rabito encantador. E quando, no jeito maravilhosamente preguiçoso acordas, eu meio encabulado, durmo na cama dos teus carinhos que fazem do momento a cumplicidade mutuamente consentida. E nesses momentos de doce cumplicidade, palavras como limite, inconveniência, perdem a dimensão e o significado, e ficam reduzidas a nada.

Quando estou contigo, meu amor, e uma onda de ternura me acaricia, o meu olhar te vai esculpindo, debruando-te com a serenidade do momento, fazendo do teu corpo a fonte dos cânticos celestiais; aí faço cartas meu amor. Cartas que ficarão na eternidade da nossa efémera existência.




quarta-feira, 14 de agosto de 2013

Mulher pequena


por Lo-Chi


Ananás pequeno e doce/ sabe ser, como se fosse/ fruta descascável, suculenta/ e desejável, a eito/ da noite ao amanhecer/ que jeito, que peito/… um confeito.//

Sabe hastear a bandeira/ com amor a pátria./ Uma pátria almíscar/ em maré cheia, sabe receber/ imergindo devagar/ um banho ondulado, vai e vem/ como convém.//

Emergido, bronzeado, em gemido/ oleado, mastro lastro/ loucura e travessura, grito surdo/ reprimido, pátria amada/ plena de aventura, se flui no instante,/ um século,/ sonho havido, desejo infante.// Pátria amada, solo térreo/ canto de fada, mergulho/ desaguar de um rio/ bandeira de orgulho./ De repente, sente/ a maré se arrebenta, na areia/ desatenta, se entrega, se semeia / ao sol ou a lua desfalecida/ a espuma, nívea se esfuma./

Esvaída na praia/ pátria amada serena/ sonolenta desmaia/ paisagem linda, de brisa esculpida/ toda nua despida, que pinta.

                                                    
                                                                                                                          In "Retraro de mulher"


segunda-feira, 12 de agosto de 2013

A noite minha confidente


por Lo-Chi

Tenho feito da noite, minha confidente. Uma amiga. Tenho conversado com ela, e falo da vida, dos anseios e ideais. Com ela falo do quotidiano. Ela, num douto silêncio, tem escutado pacientemente, e normalmente, é frugal no falar; e quando decidi, exerce com um natural fascínio. É agradável, ouvi-la num som quase inaudível, onde inalterável tem descrito o que tem visto, o que lhe agrada e desagrada. Quando se embala, excepcionalmente, é rica em factos observados.

A noite uma companheira, nela repouso, com ela converso. Converso e falo de ti, como talvez nunca falei contigo. A razão não sei. Paciente e inteligente tem escutado o meu caudal de palavras. Com a noite tenho falado do teu jeitinho, do teu sorriso, dos teus anseios e receios, do teu riso raro e breve. Tenho falado de ti e da tua tristeza. Uma vez falando de ti, segredei-lhe emocionado, quase num sussurro:

”Com ela, tudo se apresenta com uma certa estética. Mesmo a própria tristeza, nela aparece com um quê de belo, muitas vezes com algo poético.” Notei que se manteve estranhamente atenta e prossegui. ”Recordo-me que por duas vezes estive com ela chorando. Sim, o primeiro e o último encontro. Chorava por duas razões diferentes – dizia eu – mas com dois denominadores comuns.”

Aqui a noite não se conteve, interrompeu, para perguntar num acento: *”Chorar porquê, e quais esses denominadores comuns?”

Esquivando a sequência por conveniência, comecei respondendo a última parte. ”A dor e a tristeza – disse e prossegui rapidamente – mas o chorar dela, era diferente do comum. Não se ouvia nada que fosse um soluço, não se via nada que fosse uma cara desfigurada, um músculo contraído. Apenas se pressentia na expressão triste do rosto. Notava-se no deslizar, suave, de duas lágrimas que se desfiavam como dois cristais liquefeitos, rolando numa face lisa, linda e paradoxalmente … bela. Nesse choro adivinhei a dor pela face inexpressiva. Vi a magnitude pelo brilho dos olhos, pela amargura do bater do coração, pelo silêncio da boca humedecida e pela serenidade do corpo voluntariamente submisso. Reconheci a tristeza pelo silêncio funesto com que recebia as minhas palavras desajeitadas que se pretendiam consoladoras.”

Olhei para a noite que num silêncio que perturbava, ouvia-me. Fiz uma pausa que não resultou, silenciosa se manteve. *”Se fosse pintor – disse eu ainda – faria um quadro, onde poria todo o meu talento e dela faria a personificação suprema da estética, de forma que as pessoas dissessem: Que bela essa tristeza!”

Perdido  em pensamentos meus, num segundo, rememorei o quão belo, não obstante a tristeza que banhava tua alma, foi ver tua face, ausente, molhada em pranto,  qual uma pétala da açucena molhada pelo orvalho nas primeiras horas do alvor.

”Pinta com palavras”- ouvi a noite dizer.

”Acabo de pintar”- retorqui em resposta

Oiço ela a rir e eu cúmplice, ri também. Para incauto, dizer: ”De qualquer dos modos, farei um dia um poema.”

Sem esperar, remata-me matreira, em jeito de resposta: ”Sempre te ouvi dizer que não gostavas de falar do futuro.”

Engoli em seco.

Com a noite, quiçá pela segurança e confiança que me inspira, falo do presente, do passado, e com frequência pouco habitual, do futuro. Falo de ti, e tenho segredado os meus lícitos receios. Com a noite divagando, tenho desfolhado a minha memória e…discorrem factos. Quando falo de ti, tenho a impressão que melhor te conheço. Tu ausente, na noite, tenho procurado encontrar-me e … encontrar-te.

                                                                                                                          in "Cartas Intimas"

 

 





domingo, 11 de agosto de 2013

Malaika


por Lo-Chi

Toda ela é campo, musgo, canto, montanha, planície, cheiro a terra molhada, fetiche, flor silvestre, de orvalho atoalhada, relva agreste, capim, plantada em mim.

Seu andar, música divina, trauteio de um canto, no qual me encanto, me anima, em cada esquina que  passar a vejo. Tem curvas de apetência, de aventuras; umas suaves, outras apertadas perigosas.

Sua boca a doca, onde a minha se atraca, com a sua se abraça. Manga, castanha, sumo de cajú, mafurra, chindú, são os sabores. Fruto de abelha, mel, as palavras, de carinho debruadas, pele, a minha se arrepia, no sussurro de cada uma. Seu falar, trinar de passarinho, de mansinho, a alegria se expressa, simples, natural, harmonia e sedução, verdade emoção, nessa sinfonia.

Olhos seus, chindus são, em cada mirada, reluzentes, sei que não mentes, nesse brilho infindo. O olhar; a frescura do nascer do sol, o calor luminoso do meio-dia, do pôr-de-sol a expectativa, e da noite o enigma.

Fino, o corpo tropical, tecido celestial, de África tem o tom, onde sai o hino angelical. Árvore é, palmeira, no seu jeito fagueira, quem disse que era; fruta é, tôgôma, manga, mathiêlê; jambalão, anona. Nua, é a lua: cândida, argêntea, suave, iluminada. Seu abraço, água de lanho, me amasso nesse banho. Seu ventre, colcha, lisa acolhedora, concha, a cama, de quem dormir adora, nos braços de quem é âncora.


Sua coxa, percorrida, no compasso e na corrida, prelúdio de magias, feitiços e arrepios, me enlouquece. Sua erva negra me envaidece, traz promessas, de quem sem pressa, chega a flor de pétalas da vida. A flor se desabrocha, se abre, devagar, devagar, devagarinho, meu passarinho, de mansinho, em minha mão aconchegada, gruta acolhedora, fonte de águas  de prazeres, desagua, o mar do nosso amor. A flor, feita de pétalas coloridas, recebe a vela, falo, mastro, música de galo, que a madrugada presenteia, a união da noite e do dia. Quem sabia? Eu apenas intuía, que no ardor que não doía, pássaro livre no desfalecer, suga enxuga, espasmo que amo. Desfalecidos, a sobremesa na conversa se faz, mãos serenas amenas, passeiam em nós, nós desfeitos, com peitos arfantes; amantes.

                                                                                                                        in " retrato de mulher"

Os meus próximos textos



Vou dar uma guinada enorme no estilo de textos que passarei a publicar, aqui neste blogue. Vou entrar num estilo muito próximo do poema em prosa, com um conteúdo erótico sentimental, sem contudo entrar, como se poderia dizer nos filmes, no hardcore nem sequer o softcore, apenas e só muito erotismo e sentimento. Estarão os mesmo agrupados em dois grupos; um que designei de "Cartas Intimas" e outras de " Retratos de mulher" . Ficara muito próximo daquilo que uns chamaram o género epistolar, com as suas nuances.

Lo-Chi

terça-feira, 6 de agosto de 2013

A ciência de mãos dadas com o obscurantismo


por Lo-Chi

Quando sentado na mesa de bar, e só, tens a tendência incauta de, por força de circunstância, ouvir o papo das mesas vizinhas, até por que, pelo ambiente e envolvência, as conversas vão-se derramando alto, umas vezes, sendo incómodo, se porventura com uma dama estiveres e necessitares de silêncio, outras, propiciando aos metediços, entrar na conversa, mesmo que não chamado à ribalta. Nesse dia, encontrava-me só,  e para não fugir à tendência, algumas vezes, tentado fiquei, em fazer uma afirmação, para concordar ou discordar,  não sei bem com quê, todavia não  fiz, não sei, se por razões a ter com o meu temperamento, algumas vezes reservado, ou por consequência de os  resquícios de boa educação ter coibido, que a minha língua tomasse asas, e voasse ao belo prazer da conversa, conversa que decorria numa mesa vizinha. Verdade porém, é que a conversa tomava um ritmo animado, à medida que os copos se iam vazando. E essa mesa  tinha uma composição, onde a equanimidade entre homens e mulheres estava evidente. Não só no número, assim como, nas bebidas  que descarregavam para o bucho. E pelas conversas e temas, fui concluindo que eram professores, e leccionavam na mesma escola.

No meio do papo já acelerado, e retocado pela celeridade e intensidade que o álcool dá, estava um indivíduo, com ar de quem sabe o que fala, dizendo para duas das senhoras, Vocês que não tem família..., não chegou a acabar a frase, para logo ser interpelado, Quem não tem família!!?...nós não temos família? O quê que isso quer significar?, contrapôs a questão, com os olhos reluzentes de raiva, parecendo adivinhar, o que o colega, com ar de uma certa juventude, estava a querer significar. Mas este, ou incauto, ou de coragem, ou por falta de conhecimento da voracidade e ferocidade das mulheres, precisou, Vocês que não são casadas, rematou, precisando o que era para ele família. Ao que uma das senhoras percebendo a mensagem, não se fez rogada, e feroz se assanha, contra o colega atrevido, Estás a querer dizer que, eu que tenho filho, não tenho família, arreganhou os dentes, e a outra, uma terceira, como a provocar perguntou-o, Queres dizer, que tu que estas casado, tens filho, tens família?, perguntou-lhe para continuar, numa pergunta já por si esclarecedora, Eu que tenho o meu sócio, que tenho um filho não tenho família?!, uma dúvida carregada de ironia, quase anunciando, que vinha dai chumbo de alto calibre. Antes que o visado pudesse responder, um outro homem, corajoso, apercebendo-se, que o seu homólogo de sexo se havia metido em ninho de vespa, tenta atenuar a coisa, Bem, parece que não é bem isso que o Teomóteo quis dizer,  contudo este, sem ter ainda avaliado a situação, corrige o o advogado do diabo, diabo esse, em vias de ser esfolado, Foi precisamente isso que quis dizer, podes considerar que uma relação de amantimos constitui família?, não acabou a prelecção, já as damas se haviam unido automaticamente, estavam prontas para lhe porem na frigideira. Como se pode adivinhar, nesta fase, todas as armas serviam para aniquilar o pobre homem, mesmo que para tal, elas tivessem que falar mal delas próprias, Em primeiro lugar, quem te disse a ti, que teu filho, é teu filho?, como se pode ver, o tiro era de uma arma pesada e de destruição em massa, Eu tenho a certeza que meu filho, é meu, disse o mau da fita, que estava na mira das balas mortíferas das damas, já a bufarem de raiva e ódio a mistura, visto que o meu filho é parecido a mim, concluiu inocente o rapaz, que ainda não tinha notado, em que buraco se havia metido, Eeehhh, exclamam as damas em coro, quem foi que te disse, que o ser parecido atesta a paternidade?, perguntam as três em coro, Como não atesta?!, perguntou o inquirido, e eu visionando-o, já na antecâmara da morgue, vou tentando adivinhar por onde iria o raciocínio delas, e entrementes, disse com os meus botões, Queres ver que estas damas vão argumentar, com um cinismo macabro, que o filho dele, era do pai, do primo, ou do irmão?, e nessa perspectiva, fiquei preparado, para ver, impotente, a pedrada que o coitado iria receber, como golpe de misericórdia, Joana, explica a esse pobre coitado como é que essas coisas funcionam, disse uma com ar de quem sabe o que está a falar, Meu caro colega, uma mulher pode ficar grávida do outro homem e apresentar o filho como sendo do marido, e o filho não sendo, ser parecido ao esposo!, essa baralhou-me completamente, se não fosse alguém da mesa, que se me antecipou, teria eu, metendo o nariz onde não era chamado, perguntado, Como assim, de um outro homem, e o filho sair parecido ao marido??!!, perguntou um, que havia ficado muito tempo calado, bem a margem da bagunça, Pois é meu caro colega, repetiu a dama, basta apenas que ela com um pouco de paciência, calma, coragem e carinho,  uma bacia com água para que o seu marido lave uma parte do seu corpo, mãos, cara, ou pé, e dessa água, ela beba, para que  resolva o problema, vai daí que o visado no aniquilamento se contrapõe argumentando, Não acredito!! Não acredito que vocês como professoras, que têm, ou deviam ter, uma visão científica das coisas e do mundo, entram nessas crendices?, disse com um ar mais calmo e sossegado, Essa não, por favor colegas!, o que ensaiara ser advogado, volta a cena, desta vez advogando a contra-parte e outras filosofias,  Cuidado, que muitas vezes aqui em África, a ciência e o obscurantismo andam de mãos dadas, para a Joana, rematar, Eu se fosse a ti, que estás tão convicto da tua paternidade, em relação ao teu filho, aí, seria mais científico, e faria o teste do DNA, e no teu caso específico, ficarias surpreendido com o resultado, e aí, notou-se um alterar da feição do visado, dando ares, de que alguma dúvida, se havia instalado na mente, e minado a sua convicção. Lá se foi a ciência para a maneta, ou juntou-se ao obscurantismo?!




segunda-feira, 15 de julho de 2013

Encarrar

por Lo-Chi

Não conhece esse verbo, nem tão pouco é uma corruptela por pronunciamento no sotaque do sul de Moçambique, os quais têm problemas sérios com o erre e as sílabas anasaladas. É um verbo da minha autoria, que vem por similitude com uma situação bem conhecida, bem das bandas de Nampula, na relação homem mulher. Adianto; você decerto já ouviu falar do termo engarrafar(*).

Nos meus frescos anos de juventude, conheci uma mulher que era um cavalo. Um cavalo de tróia, dizia eu. Nesse então, entrei na corrida de domar sentimentalmente a cavalona. Não se atrapalhem que esses substantivos e adjectivos animalescos, na nossa gíria de então, nada tinha de pejorativo, mas tinha sim o condão, na nossa linguagem, de diferenciar uma mulher de beleza normal, daquelas esculturalmente de parar o trânsito. Agora que esclarecidos estamos, volto aos tempos de antanho. A cavalona, na altura uma poldra, era um mulheraço precoce, levando as linhas femininas da família. Porque aqui impõe-se outro rápido parêntese, vamos dizer que, da linha de montagem feminina da casa, o designer caprichou nas formas. Claro; quem não quer carros desses pilotar? E candidatos haviam muitos e eu que nunca fui piloto de corridas, retirei-me da pista. Bem, você sabe que as mulheres ficam intrigadas, sabendo da qualidade que lhes é reconhecida por todos, ver um marmanjo não entrar na corrida, no caso retirar-se, e foi essa situação de intriga que lhe levou a render-se face a este jovem de prendas várias principalmente as físicas. Aviso-lhe que não é nenhuma auto avaliação. E daí resultou uma relação que durou o tempo que durou, porém os destinos nos levaram a caminhos bifurcados, todavia longe de mim saber que havia sobrado nas papilas gustativas da dama, uma espécie de travo sabor agradável, bem semelhante ao whisky ou a cerveja, conforme o caso de deleite alcoólico. Em resumo, viciei a moça. Ficou mindependente.

Os tempos foram correndo na sua inexorável marcha, sem tempo de se ocupar dos problemas de cada um, como é normal. Num desses acasos da vida, encontramo-nos, encontro marcado por um cumprimento efusivamente festivo, com a ânsia de em pouco espaço de tempo, dizer tudo que fizemos e fomos, fazíamos e éramos, como também acabamos lembrando os velhos tempos. Porém do que éramos, trazíamos uma marca comum: relações afectivas desastrosas com filhos a mistura. Eu fui desnovelando os contornos da minha experiência com a pueril ingenuidade dos anos de juventude. Ela seguiu-me os passos com a intenção já planeada de, pelo destino tão semelhante, lhe parecer que no fundo o Ser superior nos tirava da bifurcação, e atirava para unificação. Naquele jeito peculiar de mulher, a princípio subtil, posteriormente mais literalmente expresso, a vontade de querer juntar os trapos ou os lençóis. Só que eu, feliz ou infelizmente, retive do meu pai, que erro nenhum deve ser repetido, e como a minha tentativa de vida em comum classifiquei-a de erro, longe de mim repeti-lo. E ela com a calma e a esperança no ditado, que a insistência e persistência acaba sempre ganhadora, foi fazendo-se ao piso. Debalde o esforço. Frustrada, mas não vencida, desenha a última cartada. Um desses dias, recebo um telefonema dela, Onde estás?, pergunta-me, e eu, Por aqui, respondo, e ela, Olha comprei um carro novinho em folha, importado directamente da Alemanha, quero mostrar-te, com a intenção expressa de com ele poder conseguir convencer-te a casares comigo. Ri-me à brava com a tirada e respondi-lhe perguntando, Queres encarrar-me?, já que as outras engarrafam. Rimo-nos como bons amigos que somos. Pena foi que ela não tenha insistido, teria esquecido os conselhos do velhote. Por ela, não pelo carro.


___
(*)Engarrafar é o termo popular que tenta designar uma crença baseada no facto de que há mulheres que, nos feiticeiros ou curandeiros, tratam homens resistentes e/ou avessos ao casamento de modo que se curvem a vontade delas, não poucas vezes, feitos gato-sapato.





quinta-feira, 11 de julho de 2013

Casamento: instituição ou mentira institucionalizada


por Lo-Chi


Vem esta a propósito de uma mensagem de celular que recebi de um amigo residindo bem distante, dizendo taxativamente o seguinte: “depois de longos dezassete anos e muitas rondas negociais hoje já estou divorciado. Foi assinado o veredicto final. Um abraço”(*). De repente, fiquei inadvertidamente pensando no facto, sem saber o que me impelia a isso. Até que questionei, a razão da minha preocupação, o que me levou a meditar. Provavelmente o contraste da emoção inicial na relação homem mulher, e o sentimento final com que se fica após anos. Vejamos, dizia ele, longos dezassete anos,... muitas rondas negociais... hoje, faltou ou não pôs por economia de espaço, finalmente, divorciado. Na vez de agradáveis dezasseis anos, encontramos longos, na vez de entendimento, encontramos rondas negociais, e no fim, o finalmente, da minha autoria, mas presente na intenção implícita.

Sou homem de muitos conhecidos e poucos amigos: Os meus poucos amigos nenhum deles escapou a praga do divórcio; uns poucos, ajuizados, a experiência lição, levou-os na esteira do princípio que cair num buraco e levantar faz parte do processo, mas a segunda queda no mesmo configura pura burrice; outros, corajosos, ensaiaram as segundas núpcias; um campeão vai desiludidamente na sexta núpcias, já dissolvida. Nessa esteira, recordei-me da analogia casamento muro de cemitério, onde sendo, se descobre todos eles desnecessários. No muro do cemitério, diz-se para quê, se quem está dentro, jamais sai de lá, e os que estão fora, não querem, por nada, ser inquilinos. Na mesma esteira, casar para divorciar  qual a utilidade? Pergunta que deveria ser útil incómodo permanente antes da empreitada. Casamento, diferentemente da morte, muitos querem experimentar, ainda que avisados dos desaires quase que fatídicos. As mulheres constituem neste item endémicas enfermas.

O casamento só voltará a ser, se alguma vez foi, o que dizem que foi, quando nos apercebermos de que o sentimento de um, em face de atropelos do outro, não é diferente. Todo o mundo sofre da mesma maneira. Não há sexo diferente de outro na forma de sentir e reagir as traquinices. Sofrem deste mal os homens. Outra forte razão de evidente insucesso actual da famosa instituição, que deixou de ser, é pensar-se que actos não têm consequência. Outro factor que fragiliza o casamento é de facto, a nova composição da força de trabalho. Por mais que tentemos negar é a pura verdade em virtude das proximidades agravadas, com todos ingredientes que propiciam todos os laços afectivos e emocionais inevitáveis, como mais evidência a forma de nos trajarmos. Realidade insofismável, porém inevitável.

Longas negociações, os amargos de boca, são os resultados de choques em pleno fim de casamento, que tem a sua origem num factor de que sou um acérrimo adversário: mulheres parcialmente emancipadas. Igual a emancipação restrita feita ao filho aos dezoito anos para tirar carta de condução. Usufruta do prazer da condução, mas não assume as consequências dos atropelos. E a legislação atrapalha quanto basta a emancipação efectiva da mulher. Entre a mulher (parcialmente) emancipada e a independente, eu prefiro a independente. A mulher independente é a emancipada. Com a mulher emancipada podes falar do contrato social, casamento, com o realismo requerido a partida: jogo limpo. Um dos piores factores do casamento nos moldes actuais e nas condições de hoje é o triste e irracional, bem como descontextualizado, sentido de posse que se assume. Saber que essa relação está na ordem do princípio de que; nada é eterno. Talvez assim consiga-se fazer perdurar o efémero em que ele se tornou.

Nota: imagens do google
___
PS: falo aqui da regra, o que de forma nenhuma nega a excepção. Se estiver na excepção, congratule-se.
(*)Resposta minha: “eu sem ter estado mas haver passado, para mim essa instituição(?), casamento, tem a mesma (in)utilidade que muro de cemitério. Agora sou tão prático que aprendi que para comer bife, não preciso de comprar o restaurante. Citei alguém esclarecido.”



segunda-feira, 8 de julho de 2013

Signos e imagens, significantes e siginificados -- O sentido das palavras II


por Lo-Chi

Aviso:Para maiores de dezoito anos

Estive num convívio, de homens e mulheres, casados e solteiros, onde se falava de sexo, com o maior desprendimento e hilaridade, o que entendo normal e lógico, porém tudo referido nas entrelinhas e metaforicamente. Dizia uma das convivas, Eu não como porco, e ria-se a brava, só consumo derivado de porco; uns 50 grs de chouriço!, e outra muito sacanamente questionava, Aguentar com o porco inteiro para consumir só 50 grs?. Uns com maior facilidade, outros mais lentamente, o mundo ia entendendo o que se estava a falar, de tal jeito que no fim, meio mundo partiu-se em sonoras gargalhadas. E eu perguntava-me, porquê esse trabalhão todo(*), para falar de uma coisa tão linda? Tornarmos de difícil acesso, uma coisa facilmente acessível?!

A comunicação é feita entre duas ou mais pessoas, onde são utilizados signos; escritos, gestuais ou sonoros (falados ou outros), que criam uma representação mental do objecto descrito, ou melhor o significado. A minha duvida é: se eu disser testículo, qual a diferença de imagem produzida na mente, da quando eu disser colhões? A este segundo termo foi-lhe conferido a designação de asneira. Asneira porquê, abro aqui um parêntese, se a palavra provém de asno? Será pelo facto do burro ser famoso, no ser prendado nas suas partes baixas, e por esse facto natural, ter o seu instrumento bem evidente, que tudo que a sexo se refira, designem de asneira? Desculpe esse à parte. Aliás, recordo-me que na infância, quando um puto e uma miuda fossem apanhados naqueles ensaios sexuais próprios da idade, o excluido invejoso ia dizer aos mais velhos: o João e a Joana estavam a fazer asneira! A minha questão fulcral está, no prurido que faz ao meu entendimento, no que concerne ao comportamento de comunicação da sociedade, em que falar de um objecto, pode ou não ser condenável em função do significante que utilizo. Por exemplo, eu posso falar da utilidade e vantagem, da masturbação, que é uma actividade sexual, comum, frequente e que carece de abordagem. Vejamos a questão. A masturbação é uma actividade, normalmente de auto- satisfação sexual, através do friccionamento do orgão sexual, quer masculino como feminino, que se utiliza, geralmente, como recurso a ausência de parceira(o). O que se descreve como masturbação, não é nem mais nem menos, do que o significante punheta representa. Porquê que masturbação é politicamente correcto e utilizável, e punheta(**) não? Até porque punheta é sonoramente mais agradável. Vão dizer-me, porque é calão, obsceno, lascivo, pornográfico ou asneira. Eu pergunto, o que é asneira? O acto ou a palavra? Se qualquer das palavras representa o mesmo acto!? Mais não é, quanto a mim, que o gosto mórbido do homem de complicar com regras completamente absurdas, incompreensíveis, sem fundamento, o que simples é. Tudo que se trata de sexo, complicamos, regramos o irregrável, proibimos o que desejamos e deveria ser tratado com frontalidade, com clareza e sem subterfúgio. O sexo um dos factores de qualidade de vida do homem e da mulher, foi desvirtuado, encheu-se-lhe de hipocrisia. Porquê não falar com naturalidade, da coisa que todos nós gostamos, sem necessidade de escolha de palavras, de malabarismo explicativos(*)?



Irradiamos algumas palavras da convivência com as outras, foram remetidas a uma espécie de gueto, ou talvez mesmo uma espécie de prisão, e deram-lhes a designação de asneira, palavrão, calão, insulto. E quando, paradoxalmente, a gente ganha coragem e as solta, dá uma sensação eufórica de liberdade, exacerba emoções, numa espécie de catarse, sentimo-nos maravilhosamente bem. Por isso mesmo, ainda que titubeantes, em convívios que se prezem, ( não apenas, como nos locais de trabalho, melhor agora que o género se mistura e se equilibra) o tema vem a ribalta, ainda que com subterfúgios linguísticos, mas está sempre presente. Nada mais prenhe de emoções, que falar de sexo. Já apanhou uma dama, corajosa que sabe o que quer e  utiliza no acto sexual o que chamamos de palavrões? Se é casado e nunca apanhou, aconselho-o a rezar para nunca esbarrar-se, porque o seu casamento vai para o ralo. Como anima !!

___
(*)Faz recordar as autoridades portuguesas, bem no tempo do salazarismo, no seu puritanismo provinciano, na obrigação de legislar para impedir e punir a frequência sorrelfa de pares de namorados mais ou menos afoitos, num jardim público, que ganhava frequentadores na calada da noite, publicou uma portaria: com um conteúdo próximo:” que seriam punidos todos os casais que fossem encontrados depois das 18,00hrs com as coimas e penas de acordo com a situação. Mão na mão $0,50, mão naquilo $1,00, aquilo na mão $1,50, aquilo naquilo detenção.” Se fosse nos dias actuais, teriam de facto que acrescentar: aquilo na boca e a boca naquilo. Só não sei se valeria coima ou prisão.
(**) Vejam só este absurdo criado pela mudança de verbo. Seu disser fiz uma punheta (de bacalhau) não é obsceno, mas se disser bati uma punheta é ordinarice. Que raio de incongruência