por Lo-Chi
Com a hemorragia de quadros logo após a independência de
Moçambique, o governo teve que encontrar saídas, com medidas a curto e médio
prazo, no sentido de que encontrasse formas de que a produção e a economia não
parassem nem colapsassem. De entre as medidas a médio prazo, no âmbito de
cooperação com os chamados países do leste, e não só, foram enviados estudantes
e potenciais trabalhadores para a então Alemanha do leste. Muitos deles
estiveram nas escolas técnicas e institutos, outros foram para as fábricas,
integrados nas linhas de montagem de máquinas e equipamentos agrícolas, etc.
etc. E estes alunos e operários, que estiveram um tempo considerável, vivendo
por essas bandas, acabaram se apaixonando e casando com as mulheres que se lhes
atravessaram nas vidas e os corações.
Importa referir que os estudantes que estiveram em universidades
ou institutos superiores, chegados a Moçambique, em virtude da gritante falta
de quadros, eram muitas vezes levados para projectos em curso, ou empresas já
formadas para os quadros de direcção. Os operários, grande parte que estiveram
em fábricas, nas linhas de montagens, não encontravam correspondência com as
unidades fabris então em funcionamento por cá, e acabavam tendo imensas
dificuldades de integração.
Houve meia dúzia de casais vindos da Alemanha, conforme acima
referido, que foram parar à cidade da Beira, todos devidamente colocados, posto
que vinham das instituições de ensino, cinco deles colocados nos lugares de
gestão de diversas empresas, as quais não interessa citar os nomes, e um deles,
desafortunado, chegou, depois de um período de trabalho, nas linhas de montagem
e obviamente, com dificuldades de integração. Em consequência, ele e a esposa, alemã,
foram viver para a Munhava, conforme suas posses, uma das áreas mais críticas
da cidade da Beira, onde enfrentaram toda uma série de problemas, circunscritos
aos dos bairros limítrofes: saneamento, água potável, acesso precário, falta de
energia, as doenças endémicas, etc., etc..
As cinco alemãs, depois de um período considerável de
estadia, convivendo com a facilidade que o lugar dos esposos lhes conferia,
apercebem-se das dificuldades e condições de vida que a outra tinha, muito por
força do contexto difícil em que o seu esposo se encontrava. Compatriotas,
sentiram a dor de ver uma das suas em situação deveras deplorável, em
consequência reuniram-se para debaterem o assunto e encontrarem formas de
resolver o problema. Discutido o assunto, concluiu-se que deveriam trazer a
compatriota para a casa de uma delas, e desta consultado o marido, este anuiu,
em solidariedade com a dor sentida pela sua esposa e amigas, por verem uma das
suas vivendo, o que aos olhos de todos estava claro, era um calvário, tomando
em linha de conta as suas origens. Reunido e anuído, lá deram a conhecer a dita
cuja, que em face de uma solidariedade espontânea das conterrâneas, apenas
agradeceu e fez as malas para viver com a escolhida. E de facto, pode constatar
que não apenas as condições eram excepcionais, em relação ao seu presente, bem
como a alimentação em tudo diferente, e muito próximo ao que se habituara lá
pelas alemanhas. Se nos primeiros dias pode desfrutar dessas condições, após
uma semana, sentia um tremendo hiato e depressão, que começou a pôr em dúvida,
se teria dado o melhor passo. Ao meio da segunda semana, não tinha dúvidas, mas
plena certeza, que o seu lugar não era por aquelas bandas, o que lhe levou a
abrir o coração, junto da sua conterrânea benfeitora e afiançar-lhe, perante a estupefacção
daquela, que queria voltar para casa do seu marido. E foi clara, declarando-se
grata, pelo espontâneo acolhimento do casal, bem como ao tratamento de irmã que
fora dispensada, mas que nada daquilo substituía ou afogava a saudade do
marido, principalmente nas noites em que se recordava do fausto jantar e ceia
que lhe era prodigamente facultada pelos avantajados meios do baixo-ventre do
seu querido esposo. Em suma, trocava a sorte de ter tudo, pela alegria de ser
feliz.