Por:
Lo-Chi
Houve dois momentos negativos, se assim se pode chamar, na minha
vida, que tiveram um resultado positivo, no conjunto da minha personalidade ou
mesmo do meu carácter. O primeiro foi o facto de, as primeiras namoradas que
tive e as quais a minha mãe tomou conhecimento, ela ter afirmado taxativa e
repetidamente: eu não sei como essas
miúdas se apaixonam por um gajo feio como tu! Levei a sério com tal
magnitude, que de todas as vezes que eu entrava num flerte bem sucedido, sempre
pensei que fosse, ou por uma sorte de todo tamanho, ou pelo mau gosto da miúda.
Outro momento, este devido, quiçá a sorte, ou o destino, ou a mim próprio, foi
quando tentando contrariar o meu pai, que queria à viva força que eu me
tornasse músico, onde aprendi piano durante quatro anos, desertei logo que tive
a oportunidade, pelo mero gosto de contrariar **, com tal determinação que hoje
não sei, onde se situa a tecla do dó e quantas claves existem, menos ainda
quantos compassos fazem o universo musical. As colcheias troco com colchões as
fusas confundo com fusos, não sei se com fusos horários ou se parafusos. Olhar para
aqueles hieroglíficos da pauta musical, está igualzinho o olhar para um
relatório em chinês japonês ou língua árabe.
Note-se que jamais me senti, rejeitando-me, olhava para o
espelho e a imagem agradava-me, satisfeito comigo mesmo, porém na dúvida de que
provavelmente não fosse do padrão que a maioria feminina estivesse inclinada a
gostar, induzido pela repetida afirmação da minha mãe, que diferentemente das
mães corujas, aplicava uma dose cavalar de salutar realismo ao seu filho.
Encerrava em mim, por natureza inata, um autêntico narcisista. E acho que a
minha mãe intuitivamente apercebeu-se. Como médica preventiva, impôs-me uns
alertas, que me punha com um pé atrás. Satisfazia-me plenamente, todavia sem
saber se satisfazia a clientela. Talvez isso fizesse com que, até a minha idade
dos dezoito anos, não estivesse muito inclinado a expor-me e pouco atreito aos
desafios. Desse jeito a minha inata propensão para auto satisfação e
convencimento, foi refreada.
Quando num contexto extremamente adverso e preconceituoso,
começo a ter sucessos atrás de sucesso, contra personalidades de créditos
firmados, começo a ficar claro que o produto era de muito boa qualidade e que
recomendava-se. Mas aquele polícia, sempre alerta, que a minha mãe fez questão
de implantar na minha mente, sempre me chamou, para refrear os ânimos, e
desse jeito, assim se fez este humilde e equânime cidadão.
De vez em quando, olhando para a nossa realidade, vejo
indivíduos, porque a natureza lhes conferiu alguma vantagem estética,
fazendo e desfazendo; como alguns com habilidades criativas no capítulo de som
harmonioso, enfatuados (isso citando exemplificativamente essas duas áreas, mas
extensivas a outras qualidades e ou habilidades); penso com os meus botões,
quanto eu não seria insuportável, se a minha mãe não tivesse desempenhado um
papel formidável, e se eu tivesse aliado, a minha incontestável vantagem
estética fisiológica, com a capacidade de criação e/ou interpretação musical
que o meu querido pai pretendia conferir-me. Sabemos que os músicos pela
circunstância de excepcionais, normalmente são pessoas cheias de si. Acredito
que seria um ser insuportável. Sou o que sou, graças a minha mãe a preservar-me
da soberba, com uma dose um pouco exagerada, que se não fosse a minha dose
exagerada de amor-próprio, quase me paralisava, e por outro as mulheres da
minha vida a aquilatarem-me devidamente, fazendo o justo contra-peso. Por isso
a minha eterna gratidão as mulheres. Hoje todo o sucesso que alcanço, fruo com
a humildade mínima aconselhável. Bem haja, a minha mãe!!!
** Hoje, algumas
vezes, até sinto aquele gostinho amargo do arrependimento, aquela invejazinha,
vendo alguns exímios artistas; talvez fosse um deles. Outras vezes,
arrependo-me, no benefício da dúvida, de não ter dado ao meu pai o gosto de ter
um filho que o seguisse na vocação musical.
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