por Lo-Chi
Socialmente, sem possibilidade de se tergiversar, temos estado numa
sucessão de factos nada agradáveis, de uma acrimónia constante, entre sectores
organizados da sociedade e o governo, em que o cidadão inerme é o elo mais
fraco, de toda esta batalha.
O arrolar de manifestações contra algum estado de coisas, das massas,
começou e foi desenvolvendo-se com uma persistência estóica, dos expressamente
designados por madgermanes. É verdade que o número desse grupo não era (é)
aquilo que se pode designar de massas, porém um grupo sobejamente notório, se
não mesmo expressivo. E foram expressando a sua indignação, todas as semanas ao
mesmo dia, partindo do mesmo local. Neste processo, o governo foi reagindo mais
ou menos contidamente, umas vezes, outras com ameaças veladas, mas a violência
sempre a espreita. E em termos de resposta umas vezes dando-os razão e outras
não, num processo no mínimo nubloso.
Na calha daqueles, entra a população peri-urbana da capital com alguns
rescaldos em algumas províncias, nas famosas datas de 1 e 2 de Setembro como
actividade com alguma experiência ganha no dia 5 de Fevereiro do ano 2008. A
resposta da máquina repressiva do governo não se fez esperar, e as armas de
guerra foram postas em acção com vítimas. No fim o estado foi torcendo o braço
a contra-gosto, numa espécie de malabarismo mal disfarçado e redondamente mal
elaborado- cestinha básica, recordo.
Se antes a coisa foi entre simples cidadãos desarmados, que enfrentavam
os polícias militares, na fase seguinte da instabilidade social, foi decerto,
quando no pretérito não muito distante, uma parcela substantiva dos antigos
combatentes se manifesta(ra)m contra uma situação que lhe era imposta, da qual
eles não esta(va)m de acordo. Aqui assustou-me sobremaneira, posto que
conhecendo como conheço a nossa polícia militarizada com AKMs e tais, a
situação explosiva era mais do que evidente, já porque este opositor, no mínimo
era conhecedor de tais instrumentos, e quiçá com alguma possibilidade de
acesso. Porém, a máquina repressiva do governo apareceu, com violência de
sobra, até para a população civil transeunte apanhada incauta na sua luta pela
vida.
Embalados, no que reza a constituição, os médicos, uma classe
intelectual da sociedade, quis fazer valer os seus direitos, através de
instrumentos emanados na lei, mas o governo habituado a lidar com a massa rija,
mandou de imediato a sua força repressiva, ainda que não com bastões em punho,
porém com uma presença assustadoramente presente, mais do que velada, uma
ameaça com dentes arreganhados. Porém estes, para fazer valer a
intelectualidade, foi intransigente, utilizando meios e instituições de
pressão, e pela primeira vez, ainda que não tenha posto o Governo de joelho,
pô-lo, pelo menos com uma reverência, ainda que velada e contrariada, com a
promessa de resolver, e simultaneamente, com acções subtis de retaliação, já em
curso.
Imediatamente a seguir, uma greve péssima, do ponto de vista de
segurança nacional, como também de revelação de algo péssimo no nosso ansiado
estado social, destapou a insubordinação e fez-se revelação mediática dos
nossos polícias secretos, que contrariamente o que é comum, deixaram de ser
secretos e vieram ao público dizer que são secretos públicos.
A inconformidade do partido da perdiz, umas vezes com, e outras vezes
sem razão, com a sempre recusa da sua congénere no poder, espicaçou a sua
oposição cada vez mais radicalizada, emanando gestos e palavras que encomendam
na nossa já radicalizada polícia de repressão, respostas belicistas, que em
nada afrouxam, nem o verbo nem a insistência, de uma espécie de insubordinação
civil, à breve trecho, para uma confrontação de proporções imprevisíveis.
Se olharmos para os factos e os opositores, se numa primeira fase era do
armado para o civil desarmado e sem conhecimento de qualquer arma, senão as
pedras da calçada, posteriormente os opositores do governo começam a ser grupos
que dominam as técnicas e os instrumentos de repressão, muitos desses
instrumentos ainda andam por aí a solta. E neste harém de intervenções da
polícia armada, temos que incluir, a
desastrada, gratuita e desproporcional força exibida, na greve dos
seguranças privados de Maputo, bem como o bangue bangue de Nampula, a força
emprestadas contra os deslocados e indevidamente assentados, das minas de Tete,
como ter que pôr em linha de consideração, as agressões físicas e as mortes dos
cidadãos singulares, uns que vão e outros não, desfilando informativamente nas
televisões, mas que convenhamos, vão criando rancor e “ódio concentrando e
surdo”. Por outro lado a postura pouco dialogante e a intransigência do governo
nas suas posições, a cultura da violência da polícia, muitas vezes
injustificada, dão a meteorologia dos acontecimentos, sinais de um provável
choque de proporções imprevisíveis, para os confrontos que implícita e explicitamente
se vem anunciando.
Medido tudo isso, aparece um caldeirão perfeito e propício, que pode
levar o Chefe do Estado chamar a si a prerrogativa extrema, mas justificável, de
declarar o estado de emergência, estado de sítio - na probabilidade de as ameaças
virarem factos - e naturalmente medidas administrativas especiais e restritivas
e alteração da ordem constitucional; situação convenhamos perigosamente
celerada. Nesse contexto decerto que as eleições já calendarizadas não se
farão. Apesar do nosso Chefe do Estado ter manifestado cordatamente a sua
indisponibilidade ao sacrifício de ficar mais 5 anos a frente do destino da
nação moçambicana; uma situação destas decerto levará a que o cidadão, que já
se queria na reforma, se mantenha perfunctoriamente no cargo, num sacrifício
imolador, devido a moratória a ser concedida indeterminadamente, por força da
situação. Por isso, aqui o meu apelo, ao próprio Chefe do Estado e ao Governo
que dirige, a necessidade de maior empenho no diálogo, com todos, e em especial
com a perdiz, de modo que as eleições aconteçam, e o Chefe de Estado no tempo
aprazado, possa gozar a merecida aposentadoria já anunciada, e se elimine o já
cansativo arreganhar de dentes da polícia. Poupem-nos. A nossa paz está mais
violenta que a guerra!!!
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Fui habituado a ver polícias de segurança pública, de cacete pistolas
nos coldres, que eram instrumentos bastante, para pôr na ordem os potenciais
insurrectos. Blindados, AKMs, trazem de volta os meus traumas de guerra.
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