por Lo-Chi
Recordo-me, com um sorriso nos lábios, que, quando ouvi
um presidente de uma associação dos médicos tradicionais perguntar, quem,
moçambicano, se não mesmo africano, não teria um onze no peito, corroborei. Com
toda razão e propriedade, posto que, desde presidente a servente, marcado
culturalmente, ainda que de formação superior, vai ao curandeiro ou feiticeiro,
conforme o caso de desespero ou hábito enraizado. Pura e indiscutível verdade.
Todos nós, no mínimo, umas duas vezes fomos na vida.
Eu já fui ao vovô, quando a vida me correu menos bem,
após insistência da mãezinha perguntando se perdia alguma coisa com isso, e na
sequência, adoptei o princípio de perdido por cem, perdido por mil e lá fui.
Indo, não perdi o senso crítico, não me deixei levar pelos absurdos, apesar de
seguir os rituais definidos para o caso. Também já levei o meu filho, quando
após todas a tentativas de tratamento de uma maleita que o importunava,
redundaram em fracasso, e aconselharam-me a medicina tradicional. Confesso que
fui, neste caso, em desespero de causa.
Em conversa com os amigos, tenho recolhido histórias
diversas, umas tentando pôr a nu algumas incongruências, senão mesmo, situações
completamente caricatas e absurdas, e outras mostrando a funcionalidade dos curandeiros, com factos irrefutáveis e
comprovados de desembrulhanços quase impossíveis, conseguidos com a nossa magia
negra. E nesse inventário de factos e provas, vai-se desenrolando províncias
mais destacadas, em termos de conhecimentos e peritos desta arte ou ciência.
Fala-se de Nampula, fala-se de Niassa, mostra-se que em Cabo Delegado não se
brinca, outros da Zambézia, não poucos destacam Tete, e outros tantos,
Inhambane, como também Manica e Sofala, e ainda de Maputo e Gaza como
capitaneando; em resumo, todo país tem mestres e gurus. Outrossim, em cada
província, vai-se destacando um ou outro
distrito, cuja universidade tem tido como resultado, peritos de fama e
performance sem igual. Por exemplo, Sofala tem como centro de reabilitação de
prestigio e infalibilidade impar, Gorongosa. E assim por diante, para outras
províncias.
Uma destas vezes, numa roda de amigos, versando esse
tema, um deles dizia, que todos eram uma cambada de charlatães, e que não se
devia ir nessa música. E tentando ilustrar, traz como exemplo, uma história que
se havia passado com ele, onde um curandeiro depois de todo o ritual de ossos,
missangas e conchas, na tentativa de descobrir a causa dos seus problemas, foi
chamando os antepassados e todo um rol de forças, que lhe davam a sabedoria
necessária, não só para detectar a causa e os motivos, bem como o antídoto para o
mal. Diagnosticado; o seu mal tinha origem a sua mãe, cujo motivo era o seu descontentamento, ja porque ela queria uma capulana. E dizia o meu amigo, que era
uma estrondosa mentira, posto que ela já estava morta e enterrada, havia mais de
seis anos. Todavia, encontrou a justificação para o facto, um outro
interlocutor na altura, socorrendo-se do facto de que, se até na medicina
científica, havia ginecologistas mecânicos, o que não invalidava a ciência e o
saber dos verdadeiros, porquê que essa verdade, não serviria para os
tradicionais.
Mas a minha grande questão, deste obscurantismo de mãos
dadas com a ciência, são alguns descalabros, cujos factos aparecem, relatados
vezes muitas na imprensa. Curandeiros que acusam mães de feitiçarem os seus
filhos e, em consequência, são por estes assassinadas, por esse suposto delito.
Será que uma pessoa, em sã consciência, com uma razoabilidade racional, pode
pensar, que alguém que o teve nove meses na barriga, com sacrifícios
inarráveis, com privações para o criar, que sofreu com ele e por ele, nas
incógnitas do período em que adoeceu, e... de repente, quer o seu mal e vai
feitiça-lo depois de crescido?! Onde a razoabilidade disso? Convenhamos.
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