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sábado, 1 de março de 2014

A razoabilidade racional


por Lo-Chi


Recordo-me, com um sorriso nos lábios, que, quando ouvi um presidente de uma associação dos médicos tradicionais perguntar, quem, moçambicano, se não mesmo africano, não teria um onze no peito, corroborei. Com toda razão e propriedade, posto que, desde presidente a servente, marcado culturalmente, ainda que de formação superior, vai ao curandeiro ou feiticeiro, conforme o caso de desespero ou hábito enraizado. Pura e indiscutível verdade. Todos nós, no mínimo, umas duas vezes fomos na vida.

Eu já fui ao vovô, quando a vida me correu menos bem, após insistência da mãezinha perguntando se perdia alguma coisa com isso, e na sequência, adoptei o princípio de perdido por cem, perdido por mil e lá fui. Indo, não perdi o senso crítico, não me deixei levar pelos absurdos, apesar de seguir os rituais definidos para o caso. Também já levei o meu filho, quando após todas a tentativas de tratamento de uma maleita que o importunava, redundaram em fracasso, e aconselharam-me a medicina tradicional. Confesso que fui, neste caso, em desespero de causa.

Em conversa com os amigos, tenho recolhido histórias diversas, umas tentando pôr a nu algumas incongruências, senão mesmo, situações completamente caricatas e absurdas, e outras mostrando a funcionalidade  dos curandeiros, com factos irrefutáveis e comprovados de desembrulhanços quase impossíveis, conseguidos com a nossa magia negra. E nesse inventário de factos e provas, vai-se desenrolando províncias mais destacadas, em termos de conhecimentos e peritos desta arte ou ciência. Fala-se de Nampula, fala-se de Niassa, mostra-se que em Cabo Delegado não se brinca, outros da Zambézia, não poucos destacam Tete, e outros tantos, Inhambane, como também Manica e Sofala, e ainda de Maputo e Gaza como capitaneando; em resumo, todo país tem mestres e gurus. Outrossim, em cada província,  vai-se destacando um ou outro distrito, cuja universidade tem tido como resultado, peritos de fama e performance sem igual. Por exemplo, Sofala tem como centro de reabilitação de prestigio e infalibilidade impar, Gorongosa. E assim por diante, para outras províncias.

Uma destas vezes, numa roda de amigos, versando esse tema, um deles dizia, que todos eram uma cambada de charlatães, e que não se devia ir nessa música. E tentando ilustrar, traz como exemplo, uma história que se havia passado com ele, onde um curandeiro depois de todo o ritual de ossos, missangas e conchas, na tentativa de descobrir a causa dos seus problemas, foi chamando os antepassados e todo um rol de forças, que lhe davam a sabedoria necessária, não só para detectar a causa e os motivos, bem como o antídoto para o mal. Diagnosticado; o seu mal tinha origem a sua mãe, cujo motivo era o seu descontentamento, ja porque ela queria uma capulana. E dizia o meu amigo, que era uma estrondosa mentira, posto que ela já estava morta e enterrada, havia mais de seis anos. Todavia, encontrou a justificação para o facto, um outro interlocutor na altura, socorrendo-se do facto de que, se até na medicina científica, havia ginecologistas mecânicos, o que não invalidava a ciência e o saber dos verdadeiros, porquê que essa verdade, não serviria para os tradicionais.
 
Mas a minha grande questão, deste obscurantismo de mãos dadas com a ciência, são alguns descalabros, cujos factos aparecem, relatados vezes muitas na imprensa. Curandeiros que acusam mães de feitiçarem os seus filhos e, em consequência, são por estes assassinadas, por esse suposto delito. Será que uma pessoa, em sã consciência, com uma razoabilidade racional, pode pensar, que alguém que o teve nove meses na barriga, com sacrifícios inarráveis, com privações para o criar, que sofreu com ele e por ele, nas incógnitas do período em que adoeceu, e... de repente, quer o seu mal e vai feitiça-lo depois de crescido?! Onde a razoabilidade disso? Convenhamos.







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