Dando o mote ao desafio que o ministro da educação motivou,
de repensar a educação, aqui estou eu como cidadão. E a educação precisa de ser
repensada. E no repensar a educação, feita pelos antigos ministros do pelouro,
simpatizei-me, muito especialmente, com dois excertos que tive oportunidade de
ter acesso. Primeiro do ex-ministro Augusto Jone, que pôs a questão na
quantidade de disciplinas da pequenada, da primeira a quarta classe, propondo
que apenas se centrasse no português e na aritmética. Se os nossos alunos da
primeira fase de escolaridade soubessem ao menos falar, ler, escrever bem e
fazer as operações aritméticas mais basilares da vida; somar subtrair
multiplicar e dividir, seria um estrondoso sucesso. Na vez de querermos que
saibam tanta coisa e no fundo, saindo sem saber coisa nenhuma. Por outro lado,
vi com bons olhos a chamada de atenção da outra antiga ministra de educação,
Graça, que se centrou no nível dos nossos professores em termos de domínio da
língua, que quer queiramos quer não, temos que a utilizar para a nossa desdita
ou não, que é o português. E para quem tem ouvido reportagens com intervenção
de professores até os de nível universitário, nota um tremendo deficit de
capacidade de expressar ideias, e pior ainda, com um português que seja falado
escorreitamente. Não faz uma semana, estive numa festa de graduação, onde
solicitaram a um professor universitário que tivesse uma intervenção: uma
pobreza de bradar aos céus; meu Deus! Mas entretanto, não se coibia de ser
chamado doutor. Doutor de quê? E mais escandalizado fiquei eu, quando soube que
havia sido designado tutor da defesa do graduado em questão, num curso de
Direito, para desgraça da justiça, que já anda nas ruas de amargura. Tutor??!!
As nossas universidades precisam de levar muito a sério a questão de formação
dos supostos. Foi aí que compreendi a razão de, num dos recentes imbróglios de
alunos e polícias, em plena televisão, ver um aluno universitário
presentear-nos com a seguinte expressão: “ Nós estomos” não foi uma falha porque
ele fez questão de repetir. Quanto a mim outro aspecto a tomar-se em
consideração rápida e seriamente é o número de alunos que cada sala de aula
deve comportar.
A educação precisa urgentemente de reformas ousadas, que em
última estância vão prejudicar algumas pessoas: alunos e professores. Nestes
processos é inevitável que haja prejudicados. Porém, se nos mantivermos neste
diapasão, acabaremos numa autêntica babilónia, com custos altíssimos que
provavelmente porão em causa a nossa existência como nação. Neste andar,
teremos médicos a matar, polícias a roubar, juízes condenados, advogados
defendidos, padres no feitiço, agricultores com fome, engenheiros civis sem
tecto, técnicos sem técnica, etc., etc..
No capítulo da educação, quanto à mim, as facilidades são
mais perniciosas que as dificuldades, e em última estância sei, que a exigência
faz excelência. As universidades mais famosas a nível mundial não são as que
facilitam, são as que exigem. Vi um documentário sobre o sucesso da Índia como
resultado de um posicionamento estratégico corajoso, onde o Estado chamou a si
a responsabilidade de aceitar a realidade de que nem todos temos o mesmo QI, e
determinou que aqueles com o QI acima da média, frequentassem escolas
especiais, com alto grau de exigência e dificuldade e os que se mantinham, até
um determinado nível, eram seleccionados para cursos no exterior, em
universidades altamente reconhecidas e exigentes. E hoje, o Estado que aceitou
custos e perdas, começa a recolher os benefícios dessa corajosa medida. Quem
não ouviu falar dos milagres a acontecer nas clínicas na Índia (provocando
grande fluxo de turismo de saúde) a preços relativamente baixos, quando
comparados com a Europa e América do Norte? O contrário também é valido. Nem
todos nós fomos talhados para a academia, mas nem por isso deixamos de poder
contribuir de diversas maneiras para o crescimento do país. Falo com
conhecimento de causa. Somos três irmãos e houve um, nem com a lei do chicote
as matérias escolares entravam. Fez a terceira classe a trancos e barrancos, mas
hoje é, o que o Hélder Muteia chamou, na sua crónica, “técnico wamabassa”. É um
homem de vários ofícios; carpinteiro, pedreiro, pintor, canalizador e nem por
isso, deixou de ser uma pessoa a viver condignamente, e de uma utilidade
indispensável.
O nosso descalabro do ensino primário, e por efeito dominó à
outros domínios, começa precisamente nos centros de formação dos professores,
onde as famosas metas complicam, iludem a realidade; quando a quantidade se
confunde com qualidade. E a venalidade confere a academia os tons dedáleos do
mercado do peixe. Nesta realidade, estes futuros professores só podem
multiplicar a ignorância e a trafulhice, sem desprimor dos que se aplicam e
levam a sério esta profissão nobre, que devia estar prestigiada.